DOS HOTS AOS PESADOS

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Fotos: (Divulgação)

Texto: Manoel G. M. Bandeira

Conheça a história do paranaense Zizo, um precursor do movimento Hot Rod que agora se dedica à construção de caminhões antigos!

Em 1976, o conceito de carros antigos era bem diferente do que é hoje. Muito do que consideramos como joias raras, hoje em dia, naquele tempo ainda estava em pleno uso diário. Bastava andar pelos bairros das grandes cidades, ou mesmo em pequenas cidades do interior, para que, de repente, se visse virando a esquina um velho Ford ou Chevrolet das décadas de 1920 ou 1930. A maioria desses carros ainda tinha preço de mercado e era comercializada pelo que podiam produzir, ou seja, levar pessoas e mercadorias a seus destinos.

Naqueles tempos os colecionadores procuravam por carros clássicos. Ford e Chevrolet só interessavam se fossem os modelos roadsters ou coupes. Carros de quatro portas, por mais íntegros que estivessem, só interessavam para servir como doadores de peças.

Foi em uma viagem à cidade de Cerro Azul, distante 80 km de Curitiba (PR), que o então torneiro mecânico Luiz Martins Filho, conhecido como Zizo, encontrou enterrado até a metade das portas um raro Ford 1934 coupe de 5 janelas.

Pelo estado em que o carro se encontrava, garanto que a maioria dos colecionadores não teria coragem de resgatar o “bichinho”. Mas Zizo estava acostumado a construir coisas, a inventar peças e encontrar soluções para os mais variados problemas.

Na época ele trabalhava com seu pai, Luiz Martins, a quem tive o prazer de conhecer e com ele aprender muitas coisas sobre soldas, trabalhos em metal, tornearia e motores.

A vida dá oportunidades a todos, alguns têm a felicidade de poder estudar, fazer faculdade e seguir sua profissão. Outras pessoas aprendem “fazendo” e têm como escola a própria vida. Para aqueles que têm força de vontade e inteligência, as dificuldades podem ser vencidas pela criatividade e persistência.

Um hot para chamar de seu:

Assim, Zizo arregaçou as mangas, desmontou seu Ford, encontrou outro chassi, adaptou motor, caixa e diferencial de Dodge, adaptou freios a disco em um eixo de Ford 1932 e juntou tudo isso ao seu projeto.

Porém ele queria mais. Fez a lanternagem do Fordinho (aprendeu fazendo), e até construiu rodas exclusivas. Utilizando o desenho de uma roda de madeira da década de 1920, ele fundiu réplicas modificadas em alumínio, que parafusou em um aro de ferro cromado. Um trabalho que só poderia ser realizado por quem tem muito amor pelo que faz.

A notícia de que na Vila Tingui estava sendo construído um Ford coupe de 5 janelas correu a cidade. Quem seria louco de transformar uma raridade dessas em um hot rod? Ele não era louco, mas sim um visionário. Com sua simplicidade ele estava sempre pronto a ajudar e dividir seu conhecimento e suas ideias. E, assim sendo, acabou reunindo em sua casa (oficina) uma geração de aficionados que já sonhavam com seus hot rods.

Eram outros tempos, e o sonho de ter um carro antigo devidamente adaptado era muito difícil de ser alcançado. Mas Zizo nos mostrou que isso era possível. Ele adaptou muitos carros na década de 1980, fazia as adaptações e testava cada uma delas, sempre melhorando, sempre inovando.

Nas tardes de sábado nos reuníamos no gramado que ficava nos fundos da casa dele e contávamos histórias sobre este ou aquele carro, trocávamos ideias e conhecimentos. Sempre que alguém descobria um carro diferente, tinha pressa em dividir a informação com os amigos. Bons tempos.

No começo dos anos 1990, Zizo montou um ferro-velho focado em carros antigos. Durante alguns anos ficou longe das adaptações tanto quanto podia. Mas é claro que, nas horas de folga, acabava não resistindo e adaptando uma coisa ou outra.

Para mim ele adaptou um Furgão Ford 1951, um Ford 1937 sedan, um Chevrolet 1934 quatro portas conversível, uma picape Ford 1940, além de ter contribuído com muitas ideias importantíssimas na construção de meus carros de arrancada. Ele também construiu a cabine inteira de madeira revestida em chapa de aço de um caminhão Mercedes 1929, entre tantos outros projetos.

No final dos anos 1990, Zizo vendeu sua propriedade, comprou um sítio e se mudou para o meio do mato. Todos pensamos que ele havia desistido dos motores e das adaptações. Ledo engano, hoje ele é um dos restauradores e construtores de caminhões antigos mais conhecidos e respeitados do Brasil. Isso mesmo, ele se especializou em caminhões antigos e agora, quando tenho um tempinho, vou a Campina Grande do Sul para alegrar meu coração.

Lá sempre tem gente que gosta de antigos. Sentamos em volta de caminhões e peças, muitas delas que ele constrói a mão, e ali ficamos falando sobre coisas de que gostamos tanto, carros, caminhões, motos, motores, coisas antigas em geral. Para mim esses momentos são como voltar no tempo, voltar aos meus vinte e poucos anos, quando encontrávamos velhos Ford e Chevrolet jogados em terrenos baldios e nos quintais das casas e não víamos a hora de poder dividir a nova descoberta com os amigos nas tardes de sábado.

Como a fruta nunca cai longe do pé, hoje em dia o filho de Zizo, Cassiano, segue o caminho do pai e está construindo hot rods. É claro que ele não escapa de ter que dar uma mãozinha nos caminhões de vez em quando, mas no quintal da sua casa já tem dois galpões apinhados de peças, carros e picapes antigos. E não é raro que a turma se reúna nas tardes de sábado para comer uma carninha e falar sobre carros. A história se repete, felizmente a história se repete.

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