De aço ou fibra, se você tem vontade de construir um hot ou rat rod, comece agora mesmo. Use sua criatividade, você estará entrando em um mundo maravilhoso de nostalgia, sonhos e magia
Texto: Manoel G. M. Bandeira
Fotos: Ricardo Kruppa
Hot, rat, ferrugem e fibra
Em 1998 tive meu primeiro contato com uma réplica em fibra de vidro de boa qualidade feita no Brasil. De lá para cá muita gente desenvolveu e passou a fabricar kits de vários modelos de carros, em sua maioria muito interessante para o mundo Hot Rod. É por isso que, hoje, quando vamos a um encontro de hot rods, é comum vermos 70, 80, 100 carros, ou mais. Se dependêssemos apenas dos carros de aço fabricados há mais de 50 anos, certamente os encontros e eventos de hot rods não teriam tantos participantes. Se você está entrando agora neste universo, certamente acha normal encontrar em eventos carros como o Ford 1934 coupe 3 janelas com teto rebaixado, ou, então, um roadster 1932. Mas saiba que, há pouco menos de 20 anos, isso era praticamente impossível no Brasil.
O pessoal que curte hots há mais de 20 anos sabe bem que encontrar um sedã em condições de restauração já era muito difícil. Imagine, então, conseguir um coupe ou um roadster, isso era praticamente impossível. O homem consegue fazer aquilo que acredita poder fazer. Como é impossível voltar no tempo e impedir a aniquilação de grande parte da nossa frota de carros pela indústria siderúrgica, o jeito foi começar a produzir réplicas das carrocerias antigas para satisfazer o desejo dos ávidos rodders brasileiros.
Nos EUA também
As réplicas em fibra de vidro também são muito utilizadas nos Estados Unidos. Porém, quando elas começaram a ser produzidas por lá, o motivo não foi a falta de oferta de carrocerias de aço originais no mercado, já que, ainda hoje, não é tão difícil encontrar carros como um roadster 1932 de aço à venda em terras americanas. Imagine como era a oferta destes carros no final dos anos 50. Mas, então, por que algumas pessoas, e até mesmo empresas constituídas, começaram a fabricar kits em fibra de vidro naquela época? A resposta é simples: no final da década de 1950 e começo da década de 1960, a busca por inovações, em todos os meios, era muito grande. Produtos de matéria plástica, como eram chamados na época, exerciam grande fascinação sobre o público em geral, e no meio automotivo não era diferente.
O lançamento do carro esportivo da GM, produzido com material totalmente inovador, despertou o desejo de sair na frente também nos jovens construtores de hots da época. Imagine que, no final dos anos 50, um jovem de vinte e poucos anos, ao pensar em começar seu projeto de hot, se visse na dúvida entre escolher uma carroceria original da Ford, já degradada pelo tempo, ou uma carroceria feita da mesma matéria-prima completamente inovadora de que era feito o fabuloso Corvette. Pode ter certeza de que a maioria dos construtores teria optado pela carroceria de fibra de vidro, não fosse a diferença de preço, um fator a ser considerado.
Sim, a diferença de preço. Mesmo no início da fabricação de réplicas em fibra de vidro, esta tecnologia era muito cara. Então, uma réplica em fibra de vidro certamente era bem mais cara do que uma carroceria de chapa de aço original que ainda se encontrava facilmente em um desmanche qualquer. Muitos carros clássicos da era de ouro dos hots, carros construídos por verdadeiros magos da cultura custon, foram feitos em fibra de vidro. Nomes como Ed Roth, George Barris, entre outros, usaram e abusaram do plástico reforçado com fibra de vidro. Portanto, hots construídos com este material, se bem construídos, sempre visando manter viva a cultura custom, considerando as tradições de época, têm grande apelo histórico e cultural, sim.
Hot Rods ou Rat Rods?
Os hots nasceram praticamente junto com os carros. Os primeiros rodders foram os primeiros construtores de carros da história. A mesma força criativa que impulsionou Henry Ford e Louis Chevrolet, entre tantos outros, a criar e buscar melhorar seus carros, também moveu e move os rodders até hoje em todos os cantos do mundo. O anseio por buscar a evolução e a perfeição está presente em todos os projetos de hot rods. Essa mesma evolução elevou o nível do movimento a um patamar de perfeição tão grande que, nas décadas de 1960 e 1970, muitos dos carros construídos destinavam-se somente a exposição, tamanha era a preocupação com a parte estética dos projetos. Felizmente, em meados dos anos 1990, uma nova facção começou a tomar forma.
Eram jovens que tinham dentro de si o mesmo desejo de criar, porém com os olhos voltados para o passado. Não buscavam a perfeição, mas sim o estigma, a magia de construir um carro dentro das suas próprias capacidades, criando inovações e resolvendo os problemas, de preferência utilizando peças de época, exatamente como teriam feito os jovens rodders da década de 1950. Eles não se preocupavam muito com a aparência final do carro, com acabamentos, frisos, cromados, e até mesmo com a pintura. O que eles queriam era um carro feito com as mãos, como se tivesse saído diretamente de uma máquina do tempo.
Como tudo que é inovador envolvendo a criatividade humana, este movimento silencioso evoluiu rapidamente. O curioso é que isso aconteceu em vários lugares diferentes, sem que um tivesse conhecimento do outro. O que é muito interessante e prova a legitimidade da essência do que passou a ser chamado de Rat Rod. No Brasil não foi diferente. Muitos rodders, cansados de procurar uma perfeição impossível de ser alcançada, se identificaram com o jeito despojado de carros construídos visando simplesmente o prazer de dirigir algo diferente e nostálgico.
Novamente fomos penalizados pela falta de matéria-prima. Não tínhamos carrocerias que se prestassem a alimentar a sede dos construtores que agora tinham um motivo a mais para construir um novo carro. Felizmente a principal característica que marca um rodder de verdade é a criatividade. Se, para nós, aqui no Brasil, é muito difícil encontrar um carro abandonado em um celeiro, desgastado pelo tempo, porém em condições de rodar novamente, por que não criar um desgaste com pinturas e efeitos especiais que reproduzam a ação do tempo, de forma que o carro realmente pareça ter ficado abandonado por anos e anos? Novamente a criatividade venceu, e hoje temos muita gente construindo carros visando simplesmente o prazer de dirigi-los de maneira nostálgica.
Se as carrocerias de lata não existem, estes aficionados utilizam as réplicas em fibra de vidro. E, na maioria das vezes, desenvolvem técnicas das mais variadas, utilizando peças de carros e motores como adornos e fazendo pinturas que imitam até a ferrugem com extrema perfeição. Podemos chamá-los de rat rods ou de hot rods, isso não importa, o que realmente importa é que carros e mais carros estão sendo construídos, e a cada dia que passa temos uma frota de hots cada vez maior no Brasil. Não podemos voltar no tempo e impedir que, em um país que exporta minério de ferro para o mundo todo, o patrimônio histórico seja literalmente derretido simplesmente pela ganância do homem. Mas podemos recriar carrocerias lendárias graças à versatilidade da fibra de vidro.
E, com elas, desenvolver toda a nossa criatividade em projetos que nos remetam diretamente aos tempos da brilhantina, de James Dean e Elvis Presley, um tempo de ouro, no qual o otimismo e a alegria imperavam, bem diferente dos tempos atuais. De chapas de aço ou de fibra de vidro, se você tem vontade de construir um hot ou rat rod, comece agora mesmo. Use sua criatividade, você estará entrando em um mundo maravilhoso de nostalgia, sonhos e magia.
VEJA TAMBÉM: O melhor hot rod do Brasil.