A pedido da mãe, entusiasta reúne duas carrocerias em projeto inusitado e recria um clássico que faz os noivos atrasarem na entrada da igreja…
Texto: Bruno Bocchini
Fotos: Mel Gabardo
Limousine Ford 1930
Alguns casais, mais modernos, apenas somam escovas de dente, outros – tradicionalistas – preferem costurar o amor em um matrimônio. Os preparativos começam com antecedência e vão além dos trâmites para a união civil, festa, “mimos” para convidados e, claro, a viagem de lua de mel. É preciso checar a previsão do tempo para o grande dia e decidir qual automóvel irá levar a noiva à porta da igreja. Chevrolet conversível 1947, Citröen 1951, Cadillac 1937, Rolls Royce ou Buick. As opções são vastas, mas nada como um grande clássico para “raspar as latinhas no asfalto”. Este modelo Limousine 1930 não apenas carrega a proposta de ser um “carro de noiva”, como também permite contar a própria história. Há quem afirme: se toda noiva tem como regra atrasar na hora da cerimônia, com a Limousine serão os noivos a chegarem atrasados (afinal, qual marmanjo não fica de queixo caído ao olhar um carro como este?).
Sergio Liebel, rodder e entusiasta de Curitiba (PR), atua no segmento de restauração e customização de antigos há mais de 30 anos. Apaixonado pela linha Ford da década de 30, ele é reconhecido por exibir grandes projetos, não apenas para si, mas também para amigos e clientes que procuram seus serviços na oficina Hot and Rusty. Liebel é proprietário desta Limousine e, mais que isso, não abre mão de ser também o motorista exclusivo. “Minha mãe, que acompanhou todos os projetos, um dia me pediu que fizesse um carro para noivas. Pedido dela é ordem para mim. Lembrei-me de pedaços de duas carrocerias de quatro portas que vieram em um lote de carros que havia comprado em Porto Alegre. Já havia construído outros hots apenas com pedaços da carroceria e achei que poderia transformar aqueles pedaços que sobraram em um carro para noivas. Então decidi que chamaria esse modelo de Luci, em homenagem à minha mãe. E também, é óbvio, virei o motorista”, conta.
Reunir características de dois automóveis distintos em um mesmo projeto não é tarefa fácil. Mas, segundo Liebel, ele não imaginava o trabalho que haveria pela frente. “Consultei meu parceiro de projetos Sidney Lindbek, que sempre topa qualquer parada. Eu tinha dois desafios pela frente, um deles era transformar um carro que Henry Ford inventou para ser popular em um estilo sofisticado. E o outro foi alongar o carro sem perder as curvaturas, encontrando as proporções sem deformá-lo”, explica.
Para seguir com o projeto, o rodder estudou uma Limousine Buick norte-americana que estava em um evento nos Estados Unidos. Após “transportar” as medidas para a própria Limousine Ford – somadas a sete anos de trabalho – Liebel conseguiu um resultado satisfatório. Fruto de paciência, horas de atuação e dedicação. “Viajei duas vezes aos EUA para acompanhar detalhes e comprar peças faltantes para o projeto. Existe um misto de peças de anos diferentes de toda linha Ford, mas procurei encontrar um visual mais clássico”, conta.
Quem paga é sempre o pai da noiva?
No começo do serviço, Liebel conta que já queria utilizar rodas raiadas e sem freios a disco para manter o visual original da suspensão (que manteve com eixo original, rebaixado, de duas polegadas). A carroceria foi alongada aproximadamente em 90 cm divididos por todo o carro em proporção. O jogo de rodas escolhido foi do ano de 1934, aro 16 com pneus 6.50- 16. Grade, faróis e para-choques são do modelo 1932 e volante do Ford 1937. “Inicialmente ia utilizar dois estepes nos para-lamas, mas ao montar achei o visual muito carregado e acabei optando por suporte de estepe traseiro com porta-bagagens junto”, define.
Para a concepção do chassi, Liebel contou com a ajuda do amigo de infância Emersom Luiz, o Emo, que desenvolveu um novo modelo para o carro com estrutura para que suportasse o dobro do peso que pretendia. “Não era a ideia focar no desempenho, mas sim na segurança e estabilidade. Chamei também o Haroldo Froma para ajustes de caixa de direção, pois para um carro alongado eu precisaria um sistema que tivesse grande área de giro”, argumenta.
O responsável por embalar o trajeto até a igreja é o bloco Chevrolet 4 cilindros, pelo fato de manter bom torque e manutenção fácil para uso diário. E, se por um lado a mecânica foi facilitada, outro problema – além da junção das carrocerias – estava diante do espaço interno. “Como nos Fordinhos o espaço é sempre um problema e eu queria utilizar ar-condicionado, optei por colocar as saídas do ar na divisão motorista-passageiro, que inclusive tem vidro separador como nas Limousines mais sofisticadas”.
“Mimos” a Limousine Ford 1930 esbanja sem piedade. Há campainha para o passageiro chamar o motorista, televisor, sistema de som, suporte para bebidas e taças, banco com revestimento em couro, além de pinstripes, que dão o toque refinado ao interior do clássico. “Tinha o foco de misturar o estilo nostalgia com o moderno utilizando detalhes cromados com madeira. Queria também a parede divisória com uma tela embutida de 24 polegadas, sistema de multimídia para passar arquivos fornecidos pelos pais dos noivos após a cerimônia. Tudo deu muito mais trabalho do que imaginava, mas ficou muito bom”, comemora Liebel.
A cor externa do carro dividiu opiniões. Liebel diz que amigos diziam para ele pintar a Limousine de preto, mas ele acreditava que poderia sugerir um carro fúnebre. Foi nessa fase que o entusiasta decidiu fazer uma enquete só entre o público feminino. “Mais de 80% das mulheres achavam legal usar branco. Elas que mandam. Optei por um branco mais amarelado que acabou ficando mais delicado e sofisticado”.
Após ter as ações concluídas, a Limousine teve estreia com um casal especial para Liebel. “Levei minha mãe, Luci e meu pai, Jayme, inspiradores para esse projeto e que me apoiam nas loucuras, para passear. Já fiz também alguns casamentos e o carro tem feito muito sucesso em estilo e fotografa muito bem para as memórias que são muito importantes para qualquer casal. A cada evento acabo descobrindo novos detalhes que podem melhorar e facilitar o uso. Para hot rods é a mesma coisa. Nunca está pronto. Sempre melhorando ou readequando alguma coisa”, comenta.
Uma das curiosidades que Liebel se diverte ao vivenciar está com relação aos curiosos que observam a Limousine. “Como eu sempre sou o motorista, as pessoas acabam perguntando se o dono do carro confia em me deixar dirigir. Respondo sempre que ele confia totalmente em minhas habilidades. Acho que tenho cara de motorista mesmo”, brinca.
Os convidados até podem sair reclamando da festa de casamento, mas certamente do carro não terão o que dizer – e quem duvida que não haverá casal querendo casar pela segunda vez só para desfrutar de um passeio na Limousine? Renovar os votos vai ser mais comum do que nunca…
Mecânica
Bloco Chevrolet 4cilindros
Interior
Bancos de couro, tapeçaria clara, acabamento em madeira, tela de 24 polegadas, sistema multimidia, suportes para taças e garrafas de bebida, detalhes em pintura pinstripe e campainha para chamar o motorista
Exterior
Jogo de rodas originais do Ford 1934 aro 16, pneus 6.50-16, grade, faróis e para-choques do modelo 1932, pintura em branco amarelado e suporte de estepe traseiro com porta-bagagens
Quem fez?
Projeto Hot and Rusty – Sergio Liebel e Sidney Lindbeck – (41) 3254-7178; Elétrica – Rei Davi Art Elétrica – (41) 8524-9540; Estofamentos Polaco – (41) 9155-0996; Pintura – João Duarte – (41) 3254-7178; Escapamentos Erasto – (41) 3356-2969; Pinstripes Guga Airbrush – (41) 9855-3475; Chassi e adaptação mecânica – Emersom Luiz (41) 9971-1281; Acertos da caixa de direção e tornearia – Haroldo Froma – (41) 3605-0110
Agradecimentos: Fotos – Mel Gabardo – (41) 3018 2772 e modelo Luana Malinoviski.
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