Com mecânica V8 de Mustang, Ford 46 ganha injeção eletrônica e 380 cv para “tatuar” história de entusiasta
Texto: Bruno Bocchini
Fotos: Ricardo Kruppa
Ford Coupé 1946
Não há dúvida. Boa parte dos entusiastas revive memórias da infância e adolescência junto ao carro dos sonhos. Julio Luiz Baffini, 54 anos, empresário de São Paulo, carrega lirismo ao lembrar sobre sua relação com o segmento automotivo e, claro, com o Ford Coupé 1946. Aos 13 anos, enquanto boa parte dos amigos ainda brincava nas ruas, Julio decidia integrar o trabalho em uma oficina mecânica e, durante oito anos, alimentou um ideal: conquistar um clássico com mecânica V8.
“Alguns têm a sorte de descobrir cedo o que gostam de fazer, aos 13 anos fui mecânico e nos primeiros três anos de trabalho só mexia com modelos Dodge Charger, Dart e alguns Ford Maverick. Nesse período a filosofia V8 cravou no meu sangue”, garante Julio.
O trabalho precoce “enganou” o destino de Julio. Ele seguiu outros rumos profissionais e, 37 anos depois, surgia o presente de aniversário em comemoração aos 50 anos. “A vida me levou para outro caminho, mas com o tempo veio a estabilidade e consegui finalmente me dar de presente esse clássico. Achei que poderia ter o projeto pronto em dois anos, mas aí surgiram os problemas”, comenta.
Julio procurou o profissional Norberto Jensen, proprietário da conceituada oficina Hot & Customs, de São Paulo, para iniciar as discussões sobre um provável projeto a ser desenhado. “Pesquisei alguns modelos para restaurar com base em fotos de hots americanos. Consegui achar esse 46 em Campinas com a documentação em dia. Mas aí veio a grande besteira, uma vez que não optei pelo serviço do Norberto e levei o projeto para outra oficina, mais perto da minha casa. Nesse ponto começou meu martírio e a transformação de um sonho em pesadelo”, define Julio.
Durante quatro anos o Ford Coupé 46 recebeu serviços que equivaliam a um ano de trabalho. O carro estava desmontado e, além do custo, mais gastos surgiram para dar continuidade ao processo de restauração. “Não tirei o carro dessa oficina antes porque ele estava desmontado. Assim que o arrependimento bateu e o carro foi remontado, não tive dúvida e levei para o Norberto”, conta.
Resgatando o estímulo
Julio confessa quase ter desistido de restaurar o Ford, mas assim que reforçou as conversas com Norberto o trabalho emplacou. A ideia, desde o início, era colocar mecânica V8 moderna para, segundo o proprietário, conseguir rodar no dia a dia com tranquilidade – sem surpresas ruins. “Busquei muitas referências em revistas especializadas, inclusive na Hot Rods, e também no programa de TV Overhaulin. Minha proposta era ter um clássico confiável, que não quebrasse”, pontua.
Para Norberto o maior problema ao iniciar o trabalho cercava a “herança” de um mau trabalho executado anteriormente. “Esse projeto foi iniciado em outra oficina, o que praticamente dobrou nosso trabalho, pois não tivemos que apenas dar andamento, mas sim conferir e refazer muitos serviços para se adequar ao nosso padrão de qualidade”, explica.
Julio já mantinha a imagem e os detalhes do projeto esboçados na memória – fato que colaborou diretamente para a condução do trabalho. “O fato do Julio saber exatamente o que queria nos ajudou muito a ter uma linha de projeto realista. Tivemos carta branca para resolvermos qualquer dúvida ou problema encontrado, mas tínhamos o prazer de compartilhar com o Julio, pois ele acompanhou tudo de perto”, diz Norberto.
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Juca Bala saindo da “ratoeira”
A proposta era consolidar mecânica V8 do modelo Mustang, o bloco 351 Boss, com sistema moderno de alimentação. Para isso, a Hot & Customs integrou na receita uma injeção eletrônica PRT e sistema de gerenciamento FuelTech 350. A “brincadeira” geraria 380 cavalos ao Ford Coupé, uma relação de agressividade e, ao mesmo tempo, fiel ao estilo que Julio queria. “Nós optamos ainda por freio a disco nas quatro rodas, chassi e suspensão de Landau. O câmbio é original de Mustang, manual com quatro marchas, mas talvez seja a única coisa que não me agrada. Quanto à estética, está do jeito que eu planejava”, lembra Julio.
A aquisição das rodas Foose Fishtail C – 500 para o Ford Coupé teve um capítulo próprio. Ao assistir o programa televisivo do Chip Foose, Julio viu que a empresa do designer também fabricava rodas e, sendo assim, decidiu optar por um jogo especial. “Consegui o contato da empresa Foose pelo site e, após alguns e-mails, com meu inglês básico, fiz o pedido e paguei antecipadamente. O prazo para entrega era de seis semanas, mas, para minha surpresa, em quatro semanas as rodas do meu sonho estavam no aeroporto de São Paulo”, lembra.
Para Norberto, o Ford incorporou a personalidade de Julio e, assim, se tornou mais um “desenho para gente grande ver”. “Cada projeto é um novo desafio, pois nunca um é igual ao outro. Aí está o grande segredo dos hots, a personalização. Você nunca encontra dois modelos idênticos do mesmo ano e marca em um evento. Cada hot é único e ele incorpora a personalidade do proprietário. Com o Ford também foi assim”, conclui.
Apelidado de Juca Bala – em referência ao desenho ‘Motormouse and Autocat’ e ao apelido que o irmão de Julio atribuiu a ele – o Ford Coupé 1946 ainda carrega tecnologia de ponta, com central multimídia, câmera de ré e navegador GPS. Um clássico, no mínimo, “enjoado”.
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