Seriam os blue dots, fuzzy dices & flamethrowers herança da década de 50, ou não?

Texto: Victor Rodder
Fotos: Victor Rodder e Ricardo Fallero

Blue dots

Na Hot Rods, vocês irão ver um Chevy 50 com vários acessórios de época. Dentre eles, o blue dots! Este veículo tem o pacote completo: blue dots, fuzzy dices e flamethrowers, o que me inspirou a escrever esse artigo, que estará nessa edição e nas seguintes. Blue doTs Além de ser o nome de um car club de Curitiba (do qual orgulhosamente faço parte, e que tem como “sócios”, além do Chevy 50 desta edição, um vistoso Ford 54 e um musculoso Ford 51), blue dots são acessórios utilizados nas lanternas traseiras. São pequenas “joias azuis”, feitas de vidro ou plástico, que devidamente instaladas nas luzes traseiras de freio de um hot rod ou custom car, além de garantirem um visual diferente, fazem com que as lanternas emitam um brilho púrpura único e inconfundível.

Mas a história desse acessório, e dos demais citados na chamada desse artigo, é um tanto mítica. As várias pesquisas que fiz até hoje indicam que eles não eram tão populares na década de 50 como imaginávamos. Há alguns anos, quando pensei em colocar blue dots no meu carro, fui atrás da sua história, pois queria um carro que parecesse realmente feito na década de 50. Mas a única coisa que achei na época foi um texto no qual um rodder “das antigas” descia a lenha no acessório. Dizia que isso era invenção de algum hippie da década de 70 e que ele, que havia vivido a explosão dos hot rods nos anos 50, nunca tinha sequer ouvido falar de algum carro com blue dots, muito menos visto algum. Com esta notícia, logicamente desanimei um pouco, mas meses depois acabei encontrando uma foto, tirada em outubro de 1954, de um Ford ‘51 na qual consegui ver nitidamente um blue dot! Era o que eu precisava! Dias depois estava com os meus instalados.

Mas a dúvida continuava (e continua) a respeito da origem desse ornamento e se de fato eram ou não populares já na década de 50. Hoje não há duvida de que, apesar de ser ilegal na maioria dos estados dos EUA, os blue dots são relativamente comuns. Mas eu queria realmente saber de onde saíram e qual a época da sua origem. Perguntei a vários dos meus amigos e conhecidos e ninguém soube dizer. No máximo se referiam àquela mesma reportagem que eu já havia lido. Mas, uma matéria veiculada pelo Central Oklahoma Classic Chevy Club, em 1999, que encontrei na internet, jogou uma luz nesse assunto. Na época o tema estava em voga porque o estado de Washington, nos EUA, teria dado aval para o uso de blue dots para veículos com mais de 40 anos de fabricação. Para mim, isso por si só já era um indicativo de que se tratava de um acessório típico de carros antigos.

Mas não só isso. Na mesma reportagem, a imagem de um display de lentes para reposição me chamou a atenção. Era uma propaganda de uma fábrica de lentes de Chicago, Ilinois, chamada Johnson Glass Company. Nesse display, havia várias lentes traseiras com blue dots, sendo a mais nova de um ’39. Então seria seguro dizer que em 1939 já havia blue dots rodando por aí. Novamente voltei a pesquisar e mandei a matéria para meu amigo Aurélio Backo, que sempre me ajuda nas horas difíceis.

Ele então levantou a possibilidade de que o fabricante daquele produto tivesse pensado em aumentar o seu público consumidor e, para isso, nada melhor do que vender para alguém que tivesse um carro velho e quisesse dar uma levantada nele.
Isso jogava no chão minha teoria de que os blue dots eram do final da década de 30. Mas, convencido de que precisava achar mais informações sobre isso, já que estávamos em vias de fundar o clube aqui em Curitiba, mais uma vez me debrucei sobre o teclado e pesquisei. Logo cheguei à conclusão de que, se fosse realmente intenção do fabricante produzir lentes de vidro para reposição para “carros velhos”, isso deveria ter acontecido, no máximo, em meados da década de 50. Finalmente achei no e-bay uma pessoa especializada em lentes antigas e, segundo ele, essa fábrica vendeu lâmpadas e lanternas traseiras daqueles modelos que vi no display até 58, 59, e depois parou de fabricar! Ou seja, com certeza se tratava de um display de, no máximo,1959.

Não consegui ainda saber exatamente quem e quando começou a fabricar os blue dots, mas já tenho dados concretos suficientes para afirmar que, sim, eles já estavam lá em 1959! E nessa época já eram relativamente populares pois, afinal de contas, uma fábrica de reposição de peças já os comercializava em escala. Finalmente, um argumento derradeiro para assegurar que os blue dots eram de fato acessórios que já existiam nos anos 50, foi ter encontrado a citação ao “ponto azul” em uma resenha de um dos episódios de “Could This Be You?” – um programa de rádio do início da década de 50 nos EUA.

Esse programa era uma espécie de rádio-novela e, em um dos episódios, um policial de Washington para um motorista porque ele tinha blue dots instalados nas lanternas traseiras de seu carro!

O mistério continua!

Então, era fato confirmado: esses acessórios eram anteriores à década de 50! Mas ainda estou sem saber a origem e a data em que isso tomou proporção, e espero a ajuda de quem puder mandar mais dicas. Por ora, o que posso fazer é dar um resumo das muitas versões para a história dos blue dots que encontrei. A que mais se repete e me parece mais crível é que nas décadas de 30 e 40 blue dots já eram ornamentos comercializados.

Mas provavelmente o público consumidor fosse bem restrito e mais concentrado na região nordeste do país. E, no final da década de 40, início dos anos 50, os blue dots começaram a ganhar força e muitos estados do EUA passaram a vê-los como acessórios ilegais. Qual o problema em fabricantes venderem esse acessório como um equipamento — que além de bonito, proporcionava mais segurança — já que as lâmpadas de seis volts não eram exatamente a melhor forma de emitir luz em condições adversas de clima como chuva e neblina. As autoridades insistiam muitas vezes que luzes azuis seriam exclusivas de carros de polícia e emergência e a luz emitida pelos blue dots poderia confundir algum motorista.

Algo que para mim soa como típico argumento de norte-americano. É como aqueles avisos óbvios que vemos estampados em produtos “made in USA”, do tipo: esta é uma fantasia e a capa não lhe dará condições de voar! Parece ser mais aceitável que, como os carros que utilizavam os blues dots naquela época eram normalmente carros mais antigos, muitas vezes dirigidos por minorias étnicas e/ou hot rodders, e a polícia usasse isso como desculpa para parar os carros.

Mas o fato é que, sem dúvida, isso fez com que muita gente parasse de usar os blue dots e quem os fabricasse deixasse de fazê-lo. Afinal, por que alguém ia querer um motivo justo para a polícia lhe parar, se mesmo sem motivo muitos já eram parados? Mas aí veio o revival dos Hot Rods na década de 70 e alguém milagrosamente os trouxe de volta! Por outro lado, a proibição ou, no caso, a omissão de uma legislação expressa por parte dos estados em que fosse possível saber com certeza se era ou não permitido o uso dos blue dots e a possibilidade de ser seu uso uma infração, fez com que muitos motoristas que gostavam de ostentar a pose de “rebeldes” se apaixonassem mais ainda por seus blue dots, e eles passaram a ser para muitos, sinônimo de contestação!

E no Brasil?

No Brasil não temos esse problema. Nossa legislação não diz claramente nem que sim nem que não, nunca ouvi falar de alguém que tenha sido parado devido ao uso de blue dots em seu carro. Já nos EUA a briga é feia: inúmeros são os relatos de pessoas que foram advertidas e até mesmo multadas pelo uso de blue dots. Hoje alguns estados, como Washington, Ohio e Mississippi, já permitem expressamente seu uso, mas em muitos outros, o que deveria ser uma fonte de prazer pode se tornar um problema.

Por isso muitos dos que assumem o risco de usar os blue dots lá já saem de casa com uma cópia da legislação de trânsito embaixo do banco do passageiro e sabem na ponta da língua os artigos que permitem o uso. Mas todos sabemos que polícia é polícia em qualquer lugar e, se ela te parar e não for com sua cara, vai achar fácil um motivo para te multar! Mas vou dizer que esta é uma das poucas vantagens que temos em relação aos norte-americanos no campo dos hot rods e customs cars. Aqui a policia nos vê com bons olhos! Lá, desde a década de 40, hot rod é sinônimo de arruaça e problema!

VEJA TAMBÉM: Plymouth 1929: B-29 – Ás das estradas.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here